A queda de todas as bastilhas
Paiva Netto
Dia
14 de julho. Completam-se 224 anos da Queda da Bastilha, episódio que
deflagrou a Revolução Francesa (infelizmente manchada pelo sangue dos
guilhotinados e dos famintos), cujas origens remontam aos
enciclopedistas, vanguardeiros do Iluminismo. Relativo ao tema,
selecionei apontamentos meus, ao longo do tempo, de palestras, programas
de rádio, TV e de artigos publicados no Brasil e no exterior.
Não
tenho pretensão de discutir aspectos históricos ― existem bons livros
para isso ―, contudo extrair uma importante analogia sobre quanto ainda é
forçoso trilhar a fim de que as populações da Terra deixem ruir de suas
mentes e corações a pior de todas as bastilhas: a ignorância acerca da
realidade gritante da Vida após o fenômeno da morte. Fator decisivo para
que a valorização do Ser integral (corpo e Espírito) dite as regras dos
governos das nações no terceiro milênio:
Quando garoto, devia
ter 9 para 10 anos, assisti com meu pai, Bruno Simões de Paiva
(1911-2000), no Rio de Janeiro, a um filme sobre o 14 de Julho.
Nos
séculos 17 e 18, o Absolutismo monárquico atingira intenso desvario na
terra de Diderot (1713-1784) e Montesquieu (1689-1755). Como geralmente
acontece nas relações cotidianas, se afastadas do respeito ao ser humano
e seu Espírito Eterno, houve por parte da monarquia francesa um descaso
tremendo com as necessidades básicas do seu povo, cuja expressão mais
grotesca seria a frase atribuída à rainha Maria Antonieta (1755-1793),
ao ser informada por um dos cortesões de que o barulho que a importunava
vinha das massas famintas clamando por pão: “Por que não comem
brioche?”.
Tal contingência desumana tinha de desmoronar por força do curso inexorável da História.
A
população de Paris, em 14 de julho de 1789, desesperada, marchou contra
a prisão, símbolo da tirania de que desejava livrar-se.
ABRIR CAMINHOS
Nesse
filme há uma cena impressionante. (Não sei se é uma verdade histórica,
mas está carregada de muito simbolismo). Ela representa as pessoas que
não temem abrir caminhos: o povo estava de um lado e aqueles que
protegiam a Bastilha, do outro. Entretanto, os que ameaçavam invadi-la,
com temor, não avançavam. De repente, um homem destacou-se do meio
daquela multidão e atravessou a ponte que cobria o fosso, sendo abatido
por uma descarga de tiros. Esse ato de coragem fez com que os demais o
imitassem e, assim, conseguissem entrar na fortaleza. Parece perspectiva
romântica de um momento trágico, porém retrata de modo irretocável uma
verdade: há sempre alguém que se sacrifica pela mudança substancial do
status quo. Não é preciso levar bala para que as transformações ocorram.
Há outros choques que ferem mais os vanguardeiros, a exemplo da
incompreensão, da inveja, do preconceito, da perseguição e do boicote.
Na sequência do longa-metragem, observamos a tomada da prisão, destruída de cima a baixo.
Existem
aqueles que, tentando minimizar o fato histórico, apresentam uma
argumentação frugal de que o famoso cárcere não mais tinha relevância
naquele período, pois apenas uns poucos presos lá se encontravam.
Ora,
o que o povo demoliu não só foi a construção de pedra; no entanto, o
mais expressivo emblema, para ele, do Absolutismo dinástico!
E a
palavra dinastia pode, por extensão, significar muita coisa, uma vez que
funciona tanto no feudalismo quanto na burguesia, no Capitalismo e no
próprio Comunismo. Dinastia não implica somente a sucessão por sangue.
Existe uma pior: a da ambição desmedida que arrasa o ser vivente, sob
qualquer regime.
UMA NOVA CIVILIZAÇÃO
Hoje se faz
necessário pôr abaixo as bastilhas invisíveis, todavia, de consequências
bem palpáveis: espirituais, morais, psicológicas, do sentimento.
Façamos
florescer uma civilização nova a partir da postura mental e espiritual
elevada de cada criatura. Já dizia o filósofo: “A fronteira mais difícil
a ser transposta é a do cérebro humano”. O homem foi à Lua, mas ainda
não conhece a si mesmo.
O Templo da Boa Vontade — aclamado pelo
povo uma das Sete Maravilhas de Brasília e que, segundo dados oficiais
da Secretaria de Estado de Turismo do Distrito Federal (Setur-DF), é o
monumento mais visitado da capital do país — convida as criaturas a essa
epopeia de empreender uma viagem ao seu próprio interior. Feito isso,
sair até mesmo da Via Láctea será facílimo: desde que descubramos o
âmago celeste de nosso ser, pois, na verdade, para o Espírito, o espaço
não existe.
Assegurou Jesus: “Tudo é possível àquele que crê” (Evangelho segundo Marcos, 9:23).
José de Paiva Netto, jornalista, radialista e escritor. paivanetto@lbv.org.br — www.boavontade.com